Perspectivas Filosóficas em Informação

Chamada de artigos para o Dossiê Temático da Revista Eptic sobre Economia Política da Desinformação até 30 de outubro

Divulgamos chamada de artigos para o Dossiê Temático da Revista Eptic sobre Economia Política da Desinformação, que será coordenado pelos professores Marco Schneider (Ibict e UFF) e Jonas Valente (UnB). Os trabalhos deverão ser enviados até 30 de outubro de 2020.

O chamado está disponível abaixo e também no site da Eptic: https://seer.ufs.br/index.php/eptic/announcement/view/285

Lembramos que a revista também recebe artigos em fluxo contínuo para a seção “Artigos e ensaios”.

O tema ganhou visibilidade tanto no ambiente acadêmico quanto no debate público a partir das denúncias de influência de conteúdos desinformativos em processos políticos, econômicos e sociais, em geral relacionada à estratégia de atuação contemporânea da extrema direita, em um contexto de convergência de crises do sistema capitalista. A desinformação foi apontada como fator importante nas eleições dos Estados Unidos em 2016, do Brasil em 2018 (GALHARDO, 2018) e no referendo do Brexit, em 2016 (CADWALLDR, GRAHAM-HARISSON, 2018).

Essa proliferação tem se tornado cada vez mais constante e impactante para além das eleições. Provocou, por exemplo, ondas de linchamento na Índia (SAFI, 2018) e de violência em Mianmar em 2018 (MOZUR, 2018). A pandemia do novo coronavírus também evidenciou o fenômeno, com autoridades internacionais e nacionais de saúde indicando os prejuízos de informações falsas e curas milagrosas espalhadas pela Internet.
O fenômeno ficou mais conhecido pelo termo popularizado das “fake News”. Alcott e Gentzkow (2017, p. 213) caracterizam “fake news” como “artigos de notícias que são falsos intencionalmente ou passíveis de verificação e podem confundir leitores”. Mas tanto na academia quanto em organismos internacionais (como a União Europeia ou no debate legislativo sobre o tema em curso no Brasil) o conceito mais aceito passou a ser o de “desinformação”.
Tandoc Jr. et al. (2018) traçam um histórico registrando como o termo “fake news” foi empregado para nominar diferentes finalidades, como paródia, sátira, conteúdo fabricado, manipulação, publicidade e propaganda política, mas ganhou conotações distintas, indo de um termo explicativo a uma palavra da moda (buzzword), ao passo que o termo desinformação vem sendo tratado mais sistematicamente na academia, em suas diversas modalidades. Brito e Pinheiro (2015) exploram o conceito de desinformação com base na teoria e na prática da doutrina militar americana. Froehlich (2017) dialoga com a filosofia, a psicologia social e os novos estudos sobre agnotologia, ou produção social da ignorância.
Guess, Nyhan e Reifler (2018, p. 2) falam de “um novo tipo de desinformação política”, marcado por uma “dubiedade factual com finalidade lucrativa”. Lazer et al. (2018, p. 1094) definem o problema como “informação fabricada que imita notícias na forma mas não no processo organizacional ou no intuito”. Segundo Wardle e Derakhsan (2017), a desinformação envolveria conteúdo sabidamente falso, fabricado ou manipulado com intenção de gerar dano. Diversos estudos ressaltam a relação da desinformação com a busca por obtenção de ganhos políticos e econômicos, o que aproxima o problema ainda mais dos problemas tradicionalmente abordados pela Revista Eptic.
Embora a literatura sobre o tema tenha crescido nos últimos anos, boa parte dela se dedica à análise sobre a recepção e discussão sobre o nível de impacto nos processos políticos, especialmente eleitorais, bem como acerca das propostas e formas de regulação do fenômeno (SCHNELLENBACH, 2017). Apesar de haver um reconhecimento de novas formas de desinformação a partir da capacidade de difusão pelas plataformas digitais (VALENTE, 2019), ainda há pouca literatura relacionada à perspectiva da crítica da Economia Política da Informação, da Comunicação e da Cultura (EPICC) sobre o tema, com algumas exceções (HIRST, 2017).
A edição da Revista Eptic busca, por meio de seu dossiê temático, fomentar a análise sobre a desinformação sob a ótica da EPICC. A partir da percepção das atividades relacionadas a esse campo como práticas materiais em sua relação dialética com o sistema capitalista, a análise da desinformação pode apreender as influências dos modelos de negócio e estratégias concorrenciais, das estruturas de mediação social, das assimetrias de poder, das relações de classes e forças políticas vinculadas a esse fenômeno e às estruturas onde ele se dissemina, em especial as plataformas digitais.
São esperadas contribuições sobre:
- O papel das plataformas digitais, seus modelos de negócio e estratégias concorrenciais na desinformação
- A desinformação como negócio
- Desinformação e regimes de verdade
- O fenômeno da desinformação e estratégias contemporâneas de disputas políticas
- Desinformação e crise do capitalismo
- Economia política da anticiência: negacionismo do colapso ambiental e da saúde pública

Prazo para submissão dos artigos: 30 de outubro de 2020

Referências
ALLCOTT, H. GENTZKOW, M. (2017). Social media and fake news in the 2016 election. Journal of Economic Perspectives, 31(2), 211-236.
BRITO, Vladimir de Paula; PINHEIRO, Marta Macedo Kerr. Poder informacional e desinformação. In: Tendências da Pesquisa Brasileira em Ciência da Informação, v.8, n.2, jul./dez. 2015, p. 144-164.
CADWALLDR, C. GRAHAM-HARRISSON, E. Revealed: 50 million Facebook profilesharvested for Cambridge Analytica in major data breach. The Guardian. Publicada em: 17 mar. 2018. Disponível em: < https://www.theguardian.com/news/2018/mar/17/cambridgeanalyticafacebook influence us election>.
FROEHLICH, Thomas J. A Not-So-Brief Account of Current Information Ethics: The Ethics of Ignorance, Missing Information, Misinformation, Disinformation and Other Forms of Deception or Incompetence. Textos universitaris de biblioteconomia i documentació, n. 39, dec 2017. Documento eletrônico. Disponível em: http://bid.ub.edu/en/39/froehlich.htm.
GALHARDO, R. Uso das fake news nas eleições do Brasil é “sem precedents”, diz chefe da missão da OEA. Estado de S. Paulo. Publicada em: 25 dez. 2018. Disponível em: <https://politica.estadao.com.br/noticias/eleicoes,uso-de-fake-news-nas-eleicoes-do-brasil-e-sem-precedentes-diz-chefe-de-missao-da-oea,7000256362>.
GUESS, A., NYHAN, B. REIFLER, J. Selective Exposure to Misinformation: Evidence from theconsumption of fake news during the 2016 US presidential campaign. Bruxelas: European ResearchCouncil, 2018.
HIRST, M. Towards a political economy of fake news. The political economy of communication 5, no. 2, 2017.
MOZUR, P. A Genocide Incited on Facebook, With Posts From Myanmar‘sMilitary. The New York Times. Publicada em: 15 out. 2018. Disponível em: <https://www.nytimes.com/2018/10/15/technology/myanmar-facebook-genocide.html>.
SAFI, M. 'WhatsApp murders': India struggles to combat crimes linked tomessaging service. The Guardian. Publicada em: 3 jul. 2018. Disponível em: <https://www.theguardian.com/world/2018/jul/03/whatsapp murders india struggles to combat crimes linked to messaging service>.
SCHNELLENBACH, J. On the Behavioural Political Economy of Regulating Fake News. Ordo–Jahrbuch für die Ordnung von Wirtschaft und Gesellschaft, Forthcoming, 2017.
TANDOCR Jr, E. C. LIM, Z. W. LING, R. Defining “fake news” A typology of scholarly definitions. Digital journalism, 6(2), 2018: pp. 137-153.
VALENTE, J.C.L. Tecnologia, informação e poder: das plataformas online aos monopólios digitais. 400 f., il. Tese de Doutorado. Universidade de Brasília, Brasília, Brasil, 2019.

WARDLE, C. DEAKSHAN, H. Information disorder: towards an interdisciplinary framework forresearch and policy making. Council of Europe Report, 2017.